CÉLULA TESOURO
O sonho em breve tende a se tornar realidade,
Mas será que os fins justificam os meios?
Todo organismo pluricelular é composto por diferentes tipos de células. Entre as cerca de 75 trilhões de células existentes em um homem adulto, por exemplo, são encontrados em torno de 200 tipos celulares distintos. Todos eles derivam de células precursoras, denominadas células-tronco (stem cells), ou também denominadas de células-mãe ou ainda células estaminais. O processo de diferenciação, que gera as células especializadas — da pele, dos ossos e cartilagens, do sangue, dos músculos, do sistema nervoso e dos outros órgãos e tecidos humanos — é regulado, em cada caso, pela expressão de genes específicos na célula-tronco, mas ainda não se sabe em detalhes como isso ocorre e que outros fatores estão envolvidos. Compreender e controlar esse processo é um dos grandes desafios da ciência na atualidade.
As células-tronco são células indiferenciadas, que podem se multiplicar e regenerar tecidos lesionados porque têm a capacidade de se transformar em células idênticas às dos tecidos onde foram implantadas. Por exemplo: se uma pessoa com infarto do miocárdio tem uma parte do coração afetada e as células dessa região morrem, as células-tronco podem se transformar em células cardíacas e substituir as células mortas, regenerando o tecido lesionado. Outro hipótese, no caso do diabete, é de que as células-tronco, se inseridas no pâncreas, poderiam se diferenciar e começar a produzir insulina, o que traria a cura para pessoas portadoras dessa doença.
As células-tronco estão presentes desde a vida embrionária até a vida adulta, e provavelmente até nossa morte. São elas as responsáveis pela formação do embrião e também pela manutenção dos tecidos na vida adulta.
ELAS PODEM SER:
· embrionárias (pluripotente): são primitivas (indiferenciadas) de embrião que têm potencial para se tornarem uma variedade de tipos celulares especializados de qualquer órgão ou tecido do organismo, sendo capazes de se multiplicar de forma rápida.
· adultas (multipotentes): células indiferenciadas encontradas em um tecido diferenciado, que pode renovar-se e (com certa limitação) diferenciar-se para produzir o tipo de célula especializada do tecido do qual se origina. São células maduras, sendo as mais conhecidas às encontradas na medula óssea, multiplicam-se mais lentamente e sua capacidade de geração de variedades de tecidos diferenciados é limitada. Recebem também a denominação pós-natal por alguns cientistas, por estarem presentes em recém-nascidos e no cordão umbilical.
Clique na figura para expandir
Clique na figura para expandir
VANTAGENS DO USO DAS CÉLULAS PLURIPOTENTES EMBRIONÁRIAS X CÉLULAS MULTIPOTENTES ADULTAS
· Obtenção de um número maior de tipos celulares do que no uso da célula tronco adulta;
· Maior facilidade no controle do crescimento e da diferenciação em comparação com a célula tronco adulta;
· Abundância muito maior do que as células-tronco adultas e, portanto, mais facilidade de isolar;
· Os cientistas podem utilizar os conhecimentos obtidos nos experimentos com células pluripotentes embrionárias de animais;
· As pesquisas com células pluripotentes embrionárias podem acelerar o desenvolvimento das técnicas com as células-tronco adultas.
EXISTEM EM:
· vários tecidos humanos (sangue, medula e outros tecidos) mas em quantidade muito pequena;
· no cordão umbilical e na placenta (em quantidades bem maiores);
· em embriões nas fases iniciais da divisão celular, isto é, na fase de blastócito.
PODEM SER OBTIDAS:
· Em embriões recém-fecundados (blastocistos), criados por fertilização in vitro - aqueles que não serão utilizados no tratamento da infertilidade (chamados embriões disponíveis) ou criados especificamente para pesquisa;
· embriões recém-fecundados criados por inserção do núcleo celular de uma célula adulta em um óvulo que teve seu núcleo removido - reposição de núcleo celular (denominado clonagem);
· células germinativas ou órgãos de fetos abortados;
· células sanguíneas de cordão umbilical no momento do nascimento;
· alguns tecidos adultos (tais como a medula óssea); e,
· células maduras de tecido adulto reprogramadas para ter comportamento de células-tronco.
As retiradas da medula e do cordão-umbilical possuem algumas limitações, pois não podem se diferenciar em qualquer célula. Já as de embriões são conhecidas como totipotentes e podem se transformar em qualquer tipo.
As células-tronco retiradas do próprio paciente não servem para tratar portadores de doenças genéticas como as distrofias musculares ou atrofias espinhais. Isto porque nas doenças genéticas o problema está em todas as células, apesar de só se expressar em tecidos específicos.
CONCEITUALMENTE, AS CÉLULAS-TRONCO APRESENTAM DUAS CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS:
· Auto-renovação ilimitada, por exemplo, a capacidade de multiplicar-se gerando células iguais à célula-original durante toda a vida; e,
· Pluripotência, como, por exemplo, a capacidade de gerar diferentes tipos celulares. É uma capacidade especial, porque as demais células geralmente só podem fazer parte de um tecido específico (por exemplo: células da pele só podem constituir a pele).
QUANTO À CAPACIDADE DE ORIGINAR DIFERENTES ESPÉCIES DE TECIDOS, AS CÉLULAS-TRONCO PODEM SER QUALIFICADAS COMO:
· Totipotentes: As células-tronco embrionárias que podem formar todos os tecidos incluindo a placenta são denominadas embrionárias - totipotentes. Elas constituem o primeiro grupo de até 32 células, e se formam nas primeiras 72 horas após a fecundação do óvulo. Neste momento, não é possível identificar neste grupo celular qualquer diferenciação de tecido específico. A formação da placenta e de seus anexos somente ocorre quando estas células totipotentes são implantadas no útero.
· Multipotentes: As células embrionárias, a partir do quinto ou sexto dia após a fecundação, quando constituem um grupo de 64 células, são capazes de formar qualquer espécie de tecido exceto placenta, e são denominadas células multipotentes.
· Unipotentes: Em órgãos já formados, por exemplo, o sistema nervoso, são encontradas células-tronco tipo adulto que dão origem a um único tipo de tecido, a função provável destas células é a reparação de tecidos determinados, já na medula óssea a função das células–tronco tipo adulto é manter o nível de elementos figurados do sangue que necessitam constante substituição.
· Oligopotentes: As células-tronco adultas que podem originar mais de um tipo de tecido são chamadas oligopotentes, e encontram-se, por exemplo, no tecido intestinal.
Apesar de existirem em baixa freqüência, seus números são suficientes para manter os tecidos que necessitam de renovação constante. Em alguns sistemas onde são bem caracterizadas, sua freqüência é estimada em 1 para cada 100.000 células totais daquele tecido. As células-tronco, à medida que se dividem, geram progenitores comprometidos, com uma capacidade de proliferação ainda mais limitada e um restrito potencial de diferenciação devido ao comprometimento com uma linhagem celular única. A partir deste ponto, esta célula já comprometida chamada precursor, já possui morfologia definida e seu potencial proliferativo é limitado ou mesmo nulo.
A utilização das células-tronco para fins terapêuticos pode representar talvez a única esperança para o tratamento de inúmeras doenças ou para pacientes que sofreram lesões incapacitantes da medula espinhal que impedem seus movimentos.
CLONAGEM
"A clonagem ("broto", em grego) é um método de reprodução normal para muitos seres, mas não para o resto do organismo. Por que essa diferença? As bactérias, por exemplo, que têm uma célula só, se reproduzem por meio da clonagem. Toda bactéria nasce como um clone, ou seja, as filhas são cópias genéticas perfeitas das mães, que simplesmente duplicam o seu "corpo" e depois se dividem em duas.
No resto dos organismos nenhuma célula do corpo é capaz de gerar um novo ser. A reprodução tem que ser feita por meio da fecundação, o que exige células muito especiais - o óvulo e o espermatozóide. Inexistentes nos microorganismos ou nas plantas muito primitivas, essa dupla se distingue por ter apenas um conjunto de genes, enquanto todas as outras células carregam dois conjuntos iguais. Durante a fecundação, o óvulo e o espermatozóide se unem e somam os seus genes, de modo que a célula resultante passa a ter dois conjuntos de DNA. Daí para frente, ela se multiplica, dividindo-se sucessivamente, e se transforma num embrião.
FÁBRICAS DE ÓRGÃOS – FORMAÇÃO DO EMBRIÃO
A – O embrião no início é só uma célula - o ovo, união do óvulo com o espermatozóide – que lentamente se multiplica.
B – Por volta dos quatro dias, o embrião tem cerca de 40 células formando duas esferas ocas, uma dentro da outra. A de fora vai gerar a placenta e a interna, o bebê.
C – A bola interna, nessa fase, é feita de células-tronco. Extraídas do embrião, podem ser transformadas em qualquer órgão do corpo, com a mesma identidade genética do embrião.
CLONAGEM REPRODUTIVA
A clonagem reprodutiva humana é a técnica pela qual pretende-se fazer a cópia de um indivíduo. Nessa técnica transfere-se o núcleo, que pode ser uma célula de um adulto ou de um embrião, para um óvulo sem núcleo. Se o óvulo com esse novo núcleo começasse a se dividir, fosse transferido para um útero humano e se desenvolvesse, ter-se-ia uma cópia da pessoa de quem foi retirado o núcleo da célula.
Na transferência de núcleos para fins terapêuticos as células são multiplicadas em laboratório para formar tecidos;
Na clonagem reprodutiva humana há necessidade da inserção em um útero humano.
CLONAGEM TERAPÊUTICA
Muitas pessoas pensam que a clonagem serve apenas para a criação de cópias de seres humanos. Entretanto, vários cientistas a vêem como uma possibilidade de cura para diversas doenças que atualmente não podem ser tratadas. Trata-se da tão falada clonagem terapêutica.
Esse processo consiste em obter um embrião da pessoa doente por meio da clonagem e retirar as células-tronco dele. Essas células têm potencial para se transformar em qualquer tipo de célula adulta do nosso corpo, como, por exemplo, células cardíacas ou nervosas. Assim, elas poderiam ser estimuladas a se transformar no mesmo tipo de célula que estão lesadas no organismo do doente. Por exemplo: uma pessoa com leucemia que necessitasse de um transplante de medula seria clonada, dando origem a um embrião, do qual seriam retiradas células-tronco. Dessa forma, a pessoa seria doadora para si mesma, sem correr o risco de que seu organismo viesse a rejeitar o transplante, pois as células utilizadas seriam retiradas de seu clone, que apresentaria a mesma constituição genética que ela.
Em 1997 foi anunciado o primeiro mamífero gerado a partir de células somáticas de um indivíduo adulto através da transferência nuclear, a ovelha Dolly. Em sua trilha foram gerados clones de camundongos, bovinos, e porcos, entre outros. Porém, desde 1997 aprendeu-se muito pouco sobre os mecanismos de reprogramação celular que fazem um núcleo já diferenciado, quando introduzido em um óvulo enucleado, reiniciar o programa de desenvolvimento embrionário e dar origem a um ser completo, um clone. Uma coisa aprendemos: que a clonagem como forma de reprodução de mamíferos é extremamente ineficiente. Em geral, as taxas de sucesso até 2002 variam entre 0.4-3% dependendo da espécie e do tipo celular utilizado (ver tabela abaixo).
Célula doadora Espécie Oócitos reconstr. Nascimentos vivos Obs.
Fetal
Fibroblasto Camundongo 3057 5 (0.2%)
Bovino 276 4 (1.4%)
1†
1896
6 (0.3%)
Cabra 285 3 (1.1%)
Porco
210
1 (0.5%)
Ovelha 417 14 (3.4%) 11†
Adulta
Gld. Mamária Ovelha 227 1 (0.4%)
Granulosa Camundongo 2468 31 (1.3%)
Fibroblasto Bovino 440 6 (1.4%) 2†
664 8 (1.2%)
Taxas de sucesso da clonagem reprodutiva de mamíferos (adaptado de Yanagimachi R. Cloning: experience from the mouse and other animals. Mol. Cel. Endrocrin.187:241-8, 2002). (†) Animais mortos após o nascimento.
No entanto, Dolly foi um marco na história da ciência, demonstrando pela primeira vez que uma célula já diferenciada era capaz de acessar toda a informação contida em seu genoma e dar origem a todos os tipos celulares encontrados em um indivíduo adulto. Esses mesmos mecanismos podem ser utilizados para a geração de tecidos específicos desse indivíduo, um processo chamado de clonagem terapêutica (Figura abaixo). Na clonagem terapêutica, o embrião clonado, gerado pela transferência nuclear (um conglomerado de aproximadamente 100 células), é dissociado no laboratório para a obtenção das chamadas células-tronco (CTs) embrionárias, células pluripotentes, que dariam origem a todos os tipos de células do embrião. Essas células podem ser multiplicadas em cultura, mantendo essa capacidade de diferenciação quase ilimitada. Alterando suas condições de cultivo, pode-se induzir a diferenciação dessas células em tecidos específicos, como músculo, neurônios, hepatócitos e até óvulos e espermatozóides. Assim, as CTs embrionárias podem ser fonte de tecidos para transplantes. Nos últimos 15 anos, experimentos com CTs embrionárias de camundongo vêm demonstrando o potencial terapêutico dessas células diferenciadas in vitro. A utilização de um embrião clonado como fonte de CTs embrionárias permitiria a geração de tecidos geneticamente idênticos ao paciente, logo, imunologicamente compatíveis, eliminando-se o risco de rejeição do transplante.
Clonagem terapêutica. A partir de uma célula somática do paciente, é gerado um embrião clonado que, dissociado, dará origem a CTs embrionárias geneticamente idênticas ao paciente. Essas CTs embrionárias podem ser diferenciadas em tecidos específicos de acordo com a doença do paciente. (reproduzido de "Clonagem, fatos e mitos", Editora Moderna, 2002)
A capacidade de CTs embrionárias de se diferenciar em qualquer tipo de tecido representa um enorme potencial de aplicação médica. De acordo com dados do Centers for Disease Control and Prevention, nos Estados Unidos, aproximadamente 3 mil norte-americanos morrem todo ano de doenças que no futuro poderão ser tratadas com tecidos derivados de CTs embrionárias. Um passo importante nessa direção foi o estabelecimento de linhagens de CTs embrionárias humanas. Experimentos realizados com CTs embrionárias murinas poderão ser repetidos e adaptados para as linhagens humanas.
A geração de CTs embrionárias imuno-compatíveis através da transferência nuclear e seu uso terapêutico in vivo (a clonagem terapêutica) já foram demonstrados em modelos animais. Resta agora decidirmos se essa metodologia será utilizada em seres humanos. A obtenção de CTs embrionárias envolve obrigatoriamente a destruição do embrião (blastocisto - um embrião pré-implantação de 5 dias - basicamente um conglomerado amorfo de 100 a 200 células), o que em certas culturas/religiões é inaceitável (Figura abaixo). Por isso, a clonagem terapêutica tem sido tema de grande polêmica em diversos países, inclusive na Organização das Nações Unidas (ONU).
Blastocisto. Embrião humano de 5 dias que deve
ser destruído para a obtenção de CTs embrionárias.
Em dezembro de 2001, a ONU decidiu elaborar uma Convenção Internacional Contra a Clonagem Reprodutiva de Seres Humanos, deixando claro que a clonagem como forma de reprodução de seres humanos é internacionalmente repudiada e uma ameaça à dignidade do ser humano da mesma forma que a tortura, a descriminação racial, o terrorismo etc. Durante as reuniões para a elaboração desse tratado internacional, com a participação de mais de 80 países, ficou clara a existência de um único consenso internacional: a clonagem não deve ser utilizada como forma de reprodução assistida em seres humanos.
Já a aplicação da ciência da clonagem na geração de embriões clonados para fins terapêuticos - a clonagem terapêutica - foi alvo de grande polêmica. Enquanto os EUA defendem os direitos do embrião a qualquer custo - apesar de todo dia destruírem legalmente centenas de embriões excedentes em suas clínicas de fertilização in vitro - países como Israel, China e Inglaterra permitem seu uso para fins terapêuticos. A posição norte-americana, apoiada pela Santa Sé, Itália e Espanha, é de que o processo de clonagem, e não o produto final - o clone humano -, deve ser internacionalmente banido. Mesmo que isso impeça o desenvolvimento de uma área promissora da medicina regenerativa. Essa é uma discussão complexa que envolve aspectos legais, éticos, culturais e religiosos, e que terá que ser decidida individualmente por cada país. O conflito de posições em relação à clonagem terapêutica foi tal, que até o final de 2003 impediu a elaboração da Convenção Internacional contra a clonagem reprodutiva.
Além dos dilemas ético envolvidos na destruição do embrião para a obtenção das CTs embrionárias, aqueles contra seu uso argumentam que, se permitida a geração de embriões clonados para pesquisa, isso abrirá uma brecha para a clonagem reprodutiva e surgirá um comércio de embriões/óvulos. Toda nova tecnologia está sujeita ao mau uso. Esse risco não justifica a interrupção do desenvolvimento daquela tecnologia. O que precisamos é de legislação e mecanismos de vigilância que nos protejam dos riscos do uso degenerado dos embriões/óvulos para pesquisa, sem impedir o avanço da mesma.
Finalmente, um argumento "científico" utilizado pelos antagonistas ao uso das CTs embrionárias para terapia de reposição de tecidos é que não há necessidade das mesmas uma vez que temos as CTs adultas, encontradas principalmente na medula óssea e no sangue do cordão umbilical e placentário, entre outros tecidos. Sem dúvida, as CTs adultas são uma fonte promissora e não-polêmica de tecidos autólogos para transplante. No entanto, ainda não podemos garantir que essas possuam o mesmo potencial de diferenciação que as CTs embrionárias. Assim, o momento é o de abrir o leque das pesquisas, investir em todos os tipos de CTs para determinarmos o potencial terapêutico de cada uma delas. Além disso, o que aprendermos com as pesquisas com as CTs embrionárias nos permitirá manipular as CTs adultas de forma a explorar toda a sua capacidade de trans-diferenciação.
Nos Estados Unidos o uso de embriões humanos, mesmo aqueles descartados nas clínicas de reprodução assistida, em pesquisas financiadas pelo governo é proibido. Essa posição é repudiada pela comunidade científica que, em 1999, se manifestou formalmente através de uma carta assinada por 67 cientistas premiados com o Nobel publicada na revista Science.
Por outro lado, como são permitidas pesquisas com CTs embrionárias estabelecidas antes da proibição ou através de financiamento privado ou estabelecidas em outros países, o National Institutes of Health (NIH) criou várias linhas de financiamento voltadas para o desenvolvimento das pesquisas com CTs embrionárias 58. Essas linhas incluem projetos voltados à diferenciação dessas células em diferentes tecidos; à compreensão dos mecanismos moleculares de totipotência e diferenciação das CTs embrionárias; à formação de pessoal qualificado (cursos de treinamento em cultivo de CTs embrionárias; bolsas para estágios em laboratórios que trabalham com CTs embrionárias); ao estabelecimento de bancos de linhagens de CTs embrionárias disponíveis a grupos de pesquisa, entre outros. Esse investimento reflete a importância dos estudos com CTs embrionárias, tanto aplicados quanto básicos.
Mas ainda existe uma séria e relevante discussão envolvendo a técnica: embriões teriam de ser sacrificados em prol da vida do doente. Muitas pessoas no mundo inteiro se manifestam contra esse procedimento, alegando que, se o embrião não tivesse seu desenvolvimento interrompido, uma pessoa nasceria. Isso é comparar essa forma de clonagem a um aborto. Por outro lado, muitas pessoas portadoras de doenças genéticas ou lesões medulares que impedem a locomoção defendem essa técnica porque enxergam nela a única possibilidade de cura definitiva atualmente conhecida.
UTILIDADES DAS CÉLULAS-TRONCO
Uma das principais aplicações é produzir células e tecidos para terapias medicinais. Atualmente, órgãos e tecidos doados são freqüentemente usados para repor aqueles que estão doentes ou destruídos. Infelizmente, o número de pessoas que necessitam de um transplante excede muito o número de órgãos disponíveis para transplante. E as células pluripotentes oferecem a possibilidade de uma fonte de reposição de células e tecidos para tratar um grande número de doenças.
As células-tronco podem se transformar em qualquer parte do corpo. Doenças causadas por problemas celulares podem ser curadas por injeções de células-tronco, que passam a fazer a função de suas colegas defeituosas. Tratamentos possíveis:
· Câncer - para reconstrução dos tecidos;
· Doenças do coração - para reposição do tecido isquêmico com células cardíacas saudáveis e para o crescimento de novos vasos;
· Osteoporose - por repopular o osso com células novas e fortes;
· Doença de Parkinson - para reposição das células cerebrais produtoras de dopamina;
· Diabetes - para infundir o pâncreas com novas células produtoras de insulina;
· Cegueira - para repor as células da retina;
· Danos na medula espinhal - para reposição das células neurais da medula espinal;
· Doenças renais - para repor as células, tecidos ou mesmo o rim inteiro;
· Doenças hepáticas - para repor as células hepáticas ou o fígado todo;
· Esclerose lateral amiotrófica - para a geração de novo tecido neural ao longo da medula espinal e corpo;
· Doença de Alzheimer - células-tronco poderiam tornar-se parte da cura pela reposição e cura das células cerebrais;
· Doença de Huntington – correção de neurônios;
· Distrofia muscular - para reposição de tecido muscular e possivelmente, carreando genes que promovam a cura;
· Osteoartrite - para ajudar o organismo a desenvolver nova cartilagem;
· Doença auto-imune - para repopular as células do sangue e do sistema imune;
· Doença pulmonar - para o crescimento de um novo tecido pulmonar;
· Artrite – regeneração de embriões;
· Doenças neuro-degenerativas – novos neurônios;
· Queimadura – regeneração de tecidos da pele;
· Transplantes – células-tronco geram qualquer órgão.
Como podemos ver, a aplicação das células-tronco vai revolucionar a medicina e a biologia. A sua aplicação, portanto, é motivo de muitas discussões, criando questões filosóficas, religiosas e morais levantadas pela ciência e a medicina.
As células-tronco estão trazendo esperança para muitas pessoas portadoras de doenças degenerativas como Alzheimer e Parkinson ou que sofreram acidentes e ficaram com membros paralisados, por exemplo. No entanto, ainda há um longo caminho pela frente. Existem hipóteses de que as células-tronco, se inseridas de forma incorreta, poderiam desenvolver tumores nos tecidos em que foram aplicadas. Em contrapartida, poderiam salvar vidas e amenizar o sofrimento de muitos seres humanos. Só a ciência poderá desvendar tantas questões e, quem sabe, apresentar soluções para tantas doenças incuráveis até o momento.
O CUSTO
Para se ter uma idéia dos valores seguidos nos Estados Unidos, coleta e processamento das células do cordão umbilical custam U$ 1.325 e a estocagem anual das células em nitrogênio líquido U$ 95 por ano. Terapia celular para doadores autólogos, isto é, que usam sua própria medula óssea como fonte de células-tronco, aproximadamente U$ 80 mil e, se for transplante celular alogênico, isto é, de células provenientes de um doador compatível que não ele próprio, de U$ 90 mil a US$ 150 mil. A procura por um doador compatível varia de U$ 7 mil a U$ 9 mil.
FUTURO DA TERAPIA COM CÉLULAS-TRONCO
Alguns objetivos que seriam alcançados com a utilização da terapia com as células-tronco são:
· Compreensão dos mecanismos de diferenciação e desenvolvimento;
· Identificação, isolamento e purificação dos diferentes tipos de células-tronco adultas;
· Controle da diferenciação de células-tronco para tipos celulares alvo necessários para o tratamento das doenças;
· Conhecimento para desenvolver transplantes de células-tronco compatíveis;
· Nos transplantes de células-tronco: demonstração do controle apropriado do crescimento, bem como a obtenção do desenvolvimento e função de célula normal;
· Confirmação dos resultados bem-sucedidos dos animais em seres humanos.
ÉTICA
Alguns métodos de coleta das células-tronco não geram polemicas ético-religiosas, como a coleta pelo cordão umbilical ou da medula óssea do próprio paciente. De fato, descobertas recentes evidenciaram que há células-tronco em mais tecidos adultos do que se imaginava. E também se observou que elas tinham mais versatilidade que o esperado, de modo que foi possível transformar células-tronco de um tecido em células de outros.
A polêmica surge quando se trata da retirada de células-tronco de embriões, visto que isso implica a destruição deles. Muitos argumentam que o extermínio desses embriões é tão criminoso quanto o aborto, uma vez que acaba com uma forma de vida. Aliás, embriões e fetos provenientes de abortos seriam fontes para a coleta desse material.
Argumentos dos cientistas, do ponto de vista ético, para defender o uso das células-tronco:
1. Células-tronco embrionárias possuem o atributo da pluripotência, o que quer dizer que são capazes de originar qualquer tipo de célula do organismo, exceto a célula da placenta.
2. Sabe-se que 90% dos embriões gerados em clínicas de fertilização e que são inseridos em um útero, nas melhores condições, não geram vida.
3. Embriões de má qualidade, que não têm potencial de gerar uma vida, mantêm a capacidade de gerar linhagens de células-tronco embrionárias e, portanto, de gerarem tecidos.
4. A certeza de que células-tronco embrionárias humanas podem produzir células e órgãos que são geneticamente idênticos ao paciente ampliaria a lista de pacientes elegíveis para tal terapia.
5. É ético deixar um paciente afetado por uma doença letal morrer para preservar um embrião cujo destino é o lixo? Ao utilizar células-tronco embrionárias para regenerar tecidos de um paciente não estaríamos criando uma vida?
Ninguém discute o benefício das pesquisas com células-tronco. Elas podem reproduzir-se indefinidamente em laboratório, e dar lugar a células não apenas de seu próprio tecido, mas também de outros tecidos do corpo humano. Se aprender a controlar seu desenvolvimento, podem ser usadas para consertar tecidos danificados e tratar doenças que, até agora, são incuráveis.
Os que defendem a realização de pesquisas com células-tronco embrionárias utilizam o raciocínio moral de que um bem social, que será útil para milhões de pessoas que sofrem de doenças hoje incuráveis, se sobrepõe ao de um indivíduo. Para quem a pesquisa é uma esperança de cura no futuro, a defesa é indiscutível. Foi o que mostrou Diogo Mainardi. Em um de seus artigos na revista Veja (edição 1.709 - ano 34 - nº. 28), o jornalista comentou da seguinte forma o trabalho do cientista Evan Snyder, da Universidade Harvard, que está analisando o efeito de células-tronco implantadas no cérebro de animais que sofreram grave asfixia perinatal (o mesmo que aconteceu com seu filho): "É possível que, um dia, essas pesquisas envolvam células estaminais retiradas de embriões humanos. O que fazer? Deixar as pesquisas de lado? Decretar guerra contra a Igreja Católica?", questionou-se.
A prática da clonagem-terapêutica suscita grandes dúvidas que exigem, por parte dos órgãos responsáveis estudo, bom senso e ética, para que não se legalize um comportamento que contrarie os interesses humanos e, por outro lado, abra um campo enorme à exploração maldosa.
Recentemente, as pesquisas com células-tronco tiveram inúmeras situações que atestam os riscos de espetacularizar a Ciência e o conhecimento humano. A utilização de falsas promessas, como argumento para aprovação de documentos legais, a divulgação de resultados de pesquisa fraudulentos e a venda de produtos sem comprovação médico-científica, se aproveitando do desespero de pacientes ou de seus familiares têm demonstrado o quão importante é o papel do controle social nas questões de saúde e pesquisa em saúde.
Várias questões éticas permanecem na área da pesquisa em células tronco embrionárias:
· É adequado utilizar embriões produzidos para fins reprodutivos e não utilizados, cujos prazos legais de utilização foram ultrapassados, para gerar células-tronco embrionárias?
· É aceitável produzir embriões humanos sem finalidade reprodutiva apenas para produzir células tronco?
· A justificativa da necessidade de desenvolver novas terapêuticas está acima da vida dos embriões produzidos para este fim?
· Por que não incentivar as pesquisas utilizando células tronco obtidas de outras formas, que também tem demonstrado bom potencial?
· É aceitável a utilização de óvulos não humanos para servirem substrato biológico para pesquisas em células tronco humanas, desconhecendo-se os riscos envolvidos neste tipo de procedimento?
· É justo criar um clima de expectativa para pacientes e familiares de pacientes sobre a possibilidade de uso terapêutico de células que sequer foram testadas em experimentos básicos?
Nenhum comentário:
Postar um comentário